domingo, 31 de janeiro de 2010


"Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem; pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada." Eduardo Alves da Costa

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O meu impossível

Minh’alma ardente é uma fogueira acesa,
É um brasido enorme a crepitar!
Ânsia de procurar sem encontrar
A chama onde queimar uma incerteza!

Tudo é vago e incompleto! E o que mais pesa
É nada ser perfeito.É deslumbrar
A noite tormentosa até cegar,
E tudo ser em vão! Deus, que tristeza!…

Aos meus irmãos na dor já disse tudo
E não me compreenderam!…Vão e mudo
Foi tudo o que entendi e o que pressinto…

Mas se eu pudesse a mágoa que em mim chora
Contar, não a chorava como agora,
Irmãos, não a sentia como a sinto!…

Florbela Espanca - Reliquiae

Tarde demais...

Quando chegaste enfim, para te ver
Abriu-se a noite em mágico luar;
E pra o som de teus passos conhecer
Pôs-se o silêncio, em volta, a escutar…

Chegaste enfim! Milagre de endoidar!
Viu-se nessa hora o que não pode ser:
Em plena noite, a noite iluminar;
E as pedras do caminho florescer!

Beijando a areia d’oiro dos desertos
Procura-te em vão! Braços abertos,
Pés nus, olhos a rir, a boca em flor!

E há cem anos que eu fui nova e linda!…
E a minha boca morta grita ainda:
“Por que chegaste tarde, Ó meu Amor?!…”

Florbela Espanca

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Castelo de areia


Num dia de verão, estava na praia, observando duas crianças brincando na areia.
Elas trabalhavam muito, construindo um castelo de areia, com torres, passarelas e passagens internas.
Quando estavam quase acabando, veio uma onda e destruiu tudo, reduzindo o castelo a um monte de areia e espuma.
Achei que as crianças cairiam no choro, depois de tanto esforço e cuidado, mas tive uma surpresa.
Em vez de chorar, correram para a praia, fugindo da água,
Sorrindo, de mãos dadas e começaram a construir outro castelo...
Compreendi que havia recebido uma importante lição:
Gastamos muito tempo de nossas vidas construindo alguma coisa.
E mais cedo ou mais tarde, uma onda poderá vir e destruir o que levamos tanto tempo para construir.
Mas quando isso acontecer, somente aquele que tem as mãos de alguém para segurar, será capaz de Sorrir!!!
Tudo é feito de areia;
Só o que permanece é o nosso relacionamento com as outras pessoas.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

PEDIDO



Eu não quero que você seja eu
Eu já tenho a mim.
O que quero é que você chegue
Com seu poder de chegar
E de me devolver pra mim.
Que você chegue com seu dom
De também me fazer chegar
Perto de mim...
Pra me fazer ver o que sou e que só você viu.
Pra eu ser capaz de amar também
O que só você amou.
Eu não quero que você seja igual a mim.
Eu já tenho a mim.
Não quero construir uma casa de espelhos
Que multiplique minha imagem por todos os cantos.
Quero apenas que você me reflita
Melhor do que julgo ser.

Fábio de Melo


"A vida é um milhão de novos começos movidos pelo desafio
sempre novo de viver e fazer
todo sonho brilhar..."

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

AMOR DE BIBLIOTECÁRIO

Dentre todos os registros do acervo que reside em minha memória, o teu, sem dúvida é o que possui maior número de indexadores. Não posso considerar que isso é fruto de descrição temática ou física inadequadas, nem que meu sistema esteja gerando muito ruído na busca, o fato é que durante a leitura técnica criei remissivas para todas as letras do seu nome, para todas as palavras que me causam boas sensações, para todas as boas sensações e para todos os bons sentimentos.

Nos intervalos entre nossos encontros eu modificava minha visão de mundo baseado na sua existência, daí cada paisagem estampada nas fotos de revistas e cada destino do meu guia de viagens viraram o cenário ideal para nosso romance, cada poesia e cada canção romântica tornaram-se homenagens ao amor mais sublime que alguém pudesse imaginar e cada respiração se tornou uma chance de mostrar ao mundo que o amor é possível.

Naquele dia que você pediu que eu agregasse o indexador “Acabar” ocorreu uma mensagem de erro fatal no meu sistema, fruto de uma incompatibilidade de termos, veja só, no meu tesauro o termo “Acabar” não se relaciona com o termo “Amor”, que possui relação direta com o termo “Infinito”, onde se pode ler na nota explicativa: – Não têm começo nem fim. Sei que posso ter me equivocado ou mesmo exagerado em algum ponto da premissa o “Amor é suficiente”, mas, procure entender que não se trata de irresponsabilidade ou desleixo, foi apenas inexperiência... a única razão para ter compartilhado minha história contigo é o Amor, contudo entendi que na verdade deveria ter oferecido uma Vida baseada no Amor, afinal é na Vida que o Amor se expressa.
Por recomendação de algumas pessoas que presenciaram meu sofrimento com tua partida, efetuei buscas em outras bases de dados e até tentei excluir seus registros do meu catálogo na intenção de minimizar os ruídos na busca cotidiana pela Paz, só que a Paz e o Amor que conheci ao seu lado são insubstituíveis e impossíveis de serem apagados. Resolvi, então, colocar todo o conteúdo relacionado à sua passagem em minha vida no setor de obras raras, junto com os amigos fiéis e com os dias ou noites perfeitas, assim, pode ter certeza, que nada do que você significa para mim se perderá. Sei que, atualmente, seu status é indisponível e que comutação está fora de cogitação, mas, se existir uma lista de espera, eu sou o próximo!

Oscar Lima
http://www.ofaj.com.br

domingo, 10 de janeiro de 2010

ALGUÉM




Alguém me levou de mim
Alguém que eu não sei dizer
Alguém me levou daqui.
Alguém, esse nome estranho.
Alguém que eu não vi chegar
Alguém que eu não vi partir
Alguém, que se alguém encontrar,
Recomende que me devolva a mim.

Águas Profundas

Um pingo de tudo que vivi
Me deixa flutuando no que tem por vir.
Vivi cada dia como se fosse o último.
Perdi batalhas que foram verdadeiras enxurradas
Ganhei outras jorrando alegrias para todos os lados.

Naveguei leve em dias de sol.
Despenquei cachoeiras com erros terríveis,
Mas sobrevivi a maioria das tempestades,
Sobrou apenas o que não me molhou,
Meu sonho com o infinito mar a contemplar-me, a minha vitória.

Aos trinta, reflito se cheguei à meia vida.
O tempo que ainda me resta quero botar num conta-gotas.
Os maremotos que estão por vir vão encontrar um navio maior,
Que formei devagar, sem pressa, com minhas forças e virtudes.
Meus pés descalços não furam mais com pequenos espinhos.

O rio da vida é assim.
Ir contra a correnteza.
Insistir no erro é um tiro n’água.
Desistir de transpor as maiores ondas, também o é.
Prefiro viver em águas profundas, Onde o silêncio é mais forte e a tranqüilidade é maior.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

O mal de que padeço é esse antigo descontentamento com o que sou e represento...

No meio do inverno, eu finalmente descobri que existe em mim uma primavera invencível...

Albert Camus

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Vir a ser


Eu procuro por mim.
Eu procuro por tudo o que é meu
e que em mim se esconde.
Eu procuro por um saber
que ainda não sei, mas que de alguma forma já sabe em mim.
Eu sou assim... processo constante de vir a ser.
O que sou e ainda serei
são verbos que se conjugam
sob áurea de um mistério fascinante.
Eu me recebo de Deus e a Ele me devolvo.
Movimento que não termina
porque terminar é o mesmo que deixar de ser.
Eu sou o que sou na medida em que
me permito ser.
E quando não sou é porque o ser eu não soube escolher.

Fabio de Melo